quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Meu Bem Amado


A pálida luz da lua ilumina minha janela

nesta noite escura! Lembro-me de tua tez

tão pura, dos teus beijos de mel no frio desta

madrugada. Onde não tenho teu colo para

recostar minha cabeça, nem tuas mãos a

afagar os meus cabelos.

Lá fora o vento desfolha as árvores

e em gemidos inexpressivos compõem um

treno, oh bem amada, e nessa canção coroa

a solidão de tua ausência encantada!

Es minha flor dourada, regada com amor eterno

colhida na primavera mais bela, cultivada

no jardim que cresce em minha janela.

És minha rima perfeita, és a gota de orvalho que

escorre sobre a rosa e eu apanho com a palma de

minha mão. Entras assim em minha pele,

te misturas ao meu sangue e corres tão rápida

e avassaladora em direção ao meu coração!

Donzela amada, anjo de vidro, pequena menina

és a canção que alegra os pássaros na bela estação,

és o perfume do lírio que cresce sobre montanhas

escarpadas de uma terra longínqua e bem amada.

És o calor da lenha que queima neste inverno de

frio intenso, nesta madrugada que corroi com a

saudade dos teus delicados passos em minha direção,

dos teus braços apertados em meu pescoço e dos

teus lábios coroando-me com um beijo roubado!

Es tudo oh bem amada, és também meu desatino

nos dias que te espero olhando na janela o luar.

Pálido e ansioso fico em esperar tua chegada, teu

abraço, teu abrigo suave e tuas mãos delicadas.

És meu amor eterno, és o silêncio profundo da

noite que fala ao coração apaixonado, és a chuva

que molha a roseira, és a falua que navega no

oceano, és o eflúvio da flor que nasce na primavera!

Tu és meu bosque secreto, és mais que isso, em

uma frase és meu amor, em uma palavra é minha vida,

em um gesto és meu sonho dourado e em um olhar és

meu mundo encantando, é meu bem mais amado!


Guilherme Costa

Vazio Existencial


Meu coração já não é mais o mesmo, meu caminhar

se perde por trilhas que eu não consigo alcançar.

Na minha mente corre um rio de duvidas e os meus

sonhos tornaram-se inalcançáveis. Os seus fragmentos

flutuam pelo o ar rarefeito de meus pesadelos.

Minha zona de conforto e as muletas que por muito tempo

segurei, se partiram em pedaços e só com a essência fiquei.

Existem mais perguntas que respostas e depois de tanto

tempo continuamos os mesmo; meros ícones quebrados,

discos arranhados de vinil, pássaros no emaranhado de finas

teias, lutando para não virar a presa de um aracnídeo vil.

No alto da colina onde antes havia uma cruz, uma velha e

negra cruz, hoje esta repleta de figuras geométricas, de

mapas e escalas, de regras e normas, de certezas

absolutizadas, de ausência e de graças vazias.

Você me viu passar tão cabisbaixo, mas estava ocupada

demais com os anéis dos seus dedos, com metais

sem calor, com seu umbigo e seu desamor. E eu segui

minha sina por entre percalços, se eu cair vou me arrastar

por essa lama suja, por esta estrada moribunda.

Não sobrou nada do que enfeitava a minha fé, nada das

velhas muletas, porém ainda ouço os gritos e alaridos

dos exatos matemáticos da “Santa Sé”.

Eu me vi partindo, correndo para lugar nenhum na

minha infância adormecida. Meus cabelos compridos

e com longos cachos, meu moletom azul marinho com

o rosto de um urso bordado, minha calça de abrigo

preta com um listra branca e vermelha meus pés descalços.

Meus dedos encardidos de brincar na terra, no “húmus” da

minha humildade, por estar em contato direto com ela.

Continuo correndo em minha velha infância, me vejo menino

partindo para cada vez mais longe do que sou agora.

Soluço lágrimas de desencanto, me frustrei com a verdade

que me apresentaram, com os dogmas que tolamente obedeci.

Quando vi que despojaram a velha cruz da montanha, colocando

no seu lugar um ícone vazio; abri mão de tudo que me ensinaram!

Na minha infância meus sonhos era o berço no qual descansava

meu futuro, mas quando o vi chegar nem me dei conta que fui

me perdendo na caminhada, me quebrando como um pedaço de giz.

Chegando a velha estrada, a única que sobrou, a estrada

assombrada da essência tão pequena da minha alma maltratada.

Continuei meu caminho em busca de um novo destino, carregando

no alforje um pedaço pequeno de esperança, um fardo pesado

de decepção e um pouco de fé no meu velho coração.

Dos meus ideais restou apenas a fé na velha cruz do topo da

colina; que vi algumas vezes de relance quando estava em

agonia. Confesso tentei devolve-la, desistir da fé, a deixar partir,

mas quem me deu não aceita devoluções, por isso guardei ela.

Estou de mãos vazias, perdi alguns “amigos” que não conseguem

amar quem não reza em sua cartilha. Não quero ir sozinho por isso

te convido para ires comigo. Mas se não quiseres caminhar ao

meu lado nesta loucura do andar, vou entender e continuarei minha

sina, alimentando enleios, ora desejando a morte, ora lutando para viver!

Espero chegar ao fim desta estrada ainda que o nada eu venha encontrar.


Guilherme Costa

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Estrangeiros

Fiquei revoltado e me sentindo impotente diante dos acontecimentos na faixa de Gaza, onde uma nação forte economicamente e militarmente (Israel) está literalmente trucidando centenas de inocentes em um combate contra o terrorismo. Infelizmente quem sofre nessas batalhas (como nas favelas brasileiras) são as pessoas que nada tem a ver com isso. Comovo-me diante dos acontecimentos e impossibilitado de fazer qualquer coisa oro. Oro para que o Deus dos céus que também é Deus até mesmo de quem não o conhece, seja misericordioso com as vitimas dessa barbárie! Não tendo o talento suficiente pra escrever sobre o assunto, achei uma pérola do Paulo Brabo que fala por todos os que não aplaudem esse acontecimento como prenúncios do fim ou ação de um "deus" a favor de uma raça eleita. Essa lógica nada tem a ver com o Jesus de Nazaré!


Paulo Brabo - Os estrangeiros que são todos.
Texto publicado originalmente em 25 de julho de 2006

Certo de estar a ponto de ferir a sensibilidade de alguns, quero deixar clara minha posição sobre determinado assunto: o Estado de Israel não representa qualquer continuidade, mesmo que honorária, com a tradição religiosa judaico-cristã registrada nas duas metades desiguais da Bíblia. Historicamente e espiritualmente falando o Estado de Israel não representa a religião que se convencionou chamar de judaísmo, e creio que pelo menos lá todos sabem disso.

Há muitos judeus devotos ao redor do mundo, muitos desses em Israel, mas não cabe identificar israelitas com israelenses ou o associar o Estado de Israel à Terra Prometida (e muito menos ao reino de Davi); qualquer tentativa em contrário é engano ou esforço de marketing e de relações públicas, sendo esses últimos patrocinados em grande parte pelos Estados Unidos, com o consentimento embaraçado de Israel.

Tenho amigos em Israel e estou muito longe de ser anti-semita; tenho também queridos amigos muçulmanos, e não sou ingênuo o bastante para crer que a tensão entre Israel e o mundo árabe seja simples de recapitular, de equacionar, de assimilar ou de solucionar. Também não tenho qualquer antipatia pelos israelenses que não são judeus, e tampouco creio haver qualquer diferença de mérito entre as categorias igualmente arbitrárias que acabo de mencionar.

Amai, pois, o estrangeiro, porque fostes estrangeiros na terra do Egito.

Tenho ainda a dizer que apenas as guerras me enfurecem mais do que Estados e nações; apenas as guerras soam-me mais atrozes e arbitrárias do que rótulos.

Mas a guerra é um demônio que não pára: seu emblema é o símbolo alquímico das duas salamandras devorando incessantemente uma a cauda da outra. O terrorista de um lado é o herói da resistência do outro. Cada ataque confirma as piores suspeitas que um adversário tem do seu antagonista; cada ofensiva é redimida com novos recrutamentos, que garantem a perpetuação do conflito. Os Estados Unidos permanecem liberando indiscriminadamente o Iraque, fomentando indignação igualmente justificada entre muçulmanos letrados e chãos. Israel, sentindo-se ameaçado como nunca pelo Hezbollah (que é por sua vez patrocinado por implacáveis rancores iranianos e sírios), está atacando de formas sujas e limpas palestinos e libaneses – que estão longe de ser inocentes, mas que morrem com a facilidade atroz de qualquer um – enquanto na América cristãos queimam cópias do Corãoem austera homenagem ao Príncipe da Paz.

Morrem quase quatrocentos libaneses num único dia da semana passada, ao mesmo tempo em que os israelenses abandonam em massa o norte do país temendo velhos ataques e novas retaliações.

* * *

É comum associar o cristianismo e a mensagem de Jesus a uma compreensão nova, inclusiva e compassiva sobre a natureza do “outro”. Isso é em grande parte muito acertado, mas é bom lembrar por exemplo que “amai o próximo como a ti mesmo” é injunção da Bíblia hebraica – curiosa exigência que precede a Jesus e da qual o judaísmo não prescinde.

Se Deus não faz acepção de pessoas, todos os genocídios são o mesmo.

Na verdade, são inúmeros os mandamentos da Lei de Moisés explicitamente desenhados para proteger o desavisado outro – o estrangeiro – que se encontrasse em terras de Israel. E o motor dessa tolerância, o declarado motivo para essa misericórdia, deveria ser segundo o texto a recorrente lembrança do passado de Israel como povo estrangeiro e oprimido no Egito, antes do Êxodo e da independência e da Lei: “amá-lo-eis como a vós mesmos, pois estrangeiros fostes na terra do Egito”.

O israelita é dessa forma desafiado constantemente pela sua Lei a recordar a abjeção da sua condição anterior, bem como a dispensar ao estrangeiro a misericórdia que no passado não obteve:

  • Não rebuscarás a tua vinha, nem colherás os bagos caídos da tua vinha; deixá-los-ás ao pobre e ao estrangeiro. Eu sou o SENHOR, vosso Deus.

  • Quando segardes a messe da vossa terra, não rebuscareis os cantos do vosso campo, nem colhereis as espigas caídas da vossa sega; para o pobre e para o estrangeiro as deixareis. Eu sou o SENHOR, vosso Deus.

  • Se o estrangeiro peregrinar na vossa terra, não o oprimireis.

  • Como o natural, será entre vós o estrangeiro que peregrina convosco; amá-lo-eis como a vós mesmos, pois estrangeiros fostes na terra do Egito. Eu sou o SENHOR, vosso Deus.
    (Levítico 19:10, 23:22, 19:33-34)

    Outras passagens sustentam que o verdadeiro patrocinador desse amor tolerante pelo estrangeiro/outro é o caráter singular de Deus, que não aceita suborno e não faz distinção entre as pessoas:

  • Pois o SENHOR, vosso Deus, é o Deus dos deuses e o Senhor dos senhores, o Deus grande, poderoso e temível, que não faz acepção de pessoas, nem aceita suborno;

  • que faz justiça ao órfão e à viúva e ama o estrangeiro, dando-lhe pão e vestes.

  • Amai, pois, o estrangeiro, porque fostes estrangeiros na terra do Egito.

  • Não aborrecerás o edomita, pois é teu irmão; nem aborrecerás o egípcio, pois estrangeiro foste na sua terra.

  • Não perverterás o direito do estrangeiro e do órfão; nem tomarás em penhor a roupa da viúva.

  • Quando acabares de separar todos os dízimos da tua messe no ano terceiro, que é o dos dízimos, então, os darás ao levita, ao estrangeiro, ao órfão e à viúva, para que comam dentro das tuas cidades e se fartem.
    (Deuteronômio 10:17-19, 23:7, 24:17, 26:12)

    Porém o mundo dá voltas, e os palestinos são hoje hóspedes impossivelmente incômodos dos israelenses, da mesma forma que Israel é refém do mundo árabe, embora conte com a proteção dos americanos, graças aos quais os iraquianos são também estrangeiros em sua própria terra. Só me resta pedir que Deus proteja os estrangeiros que são todos, porque não posso esperar que judeus e cristãos e muçulmanos honrem suas Escrituras ou neguem sua história.

    * * *

    Ninguém me venha, finalmente, acusar de anti-semitismo: se Deus não faz acepção de pessoas, todos os genocídios são o mesmo. Quanto a judeus e cristãos e muçulmanos que derramam sangue ao mesmo tempo em que alegam possuir alguma intimidade com a Misericórdia, façam-me um favor: vão para o inferno.

    Maldito aquele que perverter o direito do estrangeiro, do órfão e da viúva. E todo o povo dirá: Amém!
    (Deuteronômio 27:19)



segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Sobre Esperança e o Tempo


ESPERANÇA

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E
— ó delicioso vôo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança...
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...

Mário Quintana


Em cada amanhecer temos uma nova oportunidade. Oportunidade para corrigir erros, para ligar para amigos há muito esquecidos, para amar com tudo que temos e somos. Oportunidade para correr atrás de sonhos adormecidos, para beijar uma moça bonita, brincar e sorrir com uma linda criança, ver o sol nascer ou a tempestade se formar e mesmo assim o dia não vai perder o seu encanto! O problema, o grande vilão que atrapalha o homem de aproveitar todas as oportunidades tem nome. Chama-se “tempo”. E assim é nossa vida guiada pelos ponteiros dos relógios. Cada segundo um batimento, um descompasso, um sentimento um novo medo; cada segundo é um grão da ampulheta da vida que se perde no momento, que some e se consome no vácuo gerado pelo nada!

Aproveitar a oportunidade é de extrema importância para ser “salvo”. Ser salvo e redimido ainda nessa vida no “Já agora” em uma perspectiva terrena e humana, de potencialidades usadas para beneficiar o mundo a nossa volta. O nosso “mundinho” de afazeres, medos, angustias, alegrias, amigos, “inimigos”, sonhos, fantasias; o nosso “mundinho” rodeado de amor e ódio; o nosso “mundinho” de pai ou pais, de mãe ou mães, de irmãos. Ele merece que aproveitemos à oportunidade e façamos de cada “grão de areia de nossa ampulheta” momentos únicos e belos. O tempo esse gigante invisível que sentimos passar tão rápido por nós, esse “Vendigo” da estória do Stephen King¹, possui dois nomes em grego. Kairós (καιρός) e Chronos (Χρόνος) essas duas palavras tem muito a nos ensinar.

Chronos um deus mitológico grego que surgiu nos princípios dos tempos, formado por si mesmo era um ser incorpóreo e serpentino possuindo três cabeças, uma de homem, uma de touro e outra de leão uniu-se a sua companheira Anaké (anake) que significa Inevitabilidade. Numa espiral em volta do ovo primogênito separando-o, formando então o Universo ordenado com a Terra, o mar e o céu. Permaneceu na mitologia como um deus remoto e sem corpo, que rodeava o Universo, conduzindo a rotação dos céus e o caminho eterno do tempo, aparecendo ocasionalmente perante Zeus sobre a forma de um homem idoso de longo cabelos e barba brancos. Embora permanecesse a maior parte do tempo em forma de uma força para além do alcance e do poder dos deuses mais jovens. Uma das representações mais bizarras de Chronos é a de um homem que devora o seu próprio filho, numa acto de canibalismo. Esta reprensentação deve-se ao fato de os antigos gregos tomarem Chronos como o criador do tempo casado com a Inevitabilidade, logo é impossível fugir ao tempo, todos seriam mais cedo ou mais tarde vencidos (devorados) por ele. Esse é o tempo de quem perde tempo ou desperdiça oportunidades. Esse vilão o Chronos junto com o inevitável roubara cada segundo seu desperdiçado com a ansiedade, cada segundo seu desperdiçado com o medo, cada segundo seu desperdiçado com a falta de confiança no verdadeiro Deus!

Já Kairós significa "tempo determinado" ou "momento no tempo" e são esses momentos que devem reger nossa vida. O tempo mitológico que tem como companheira a inevitabilidade não deve ser o nosso tempo e nem devemos nos preocupar com ele. O nosso tempo é o Kairós o tempo da graça de Deus, os momentos que fazem nossa vida!

O Sábio Livro de Eclesiastes nos fala desse tempo:

“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu: Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derribar, e tempo de edificar.

Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de saltar; Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar; Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de deitar fora; Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar; Tempo de amar, e tempo de aborrecer; tempo de guerra, e tempo de paz.” (Eclesiastes 3.1-8).

No poema do Quintana acima a grande transformação do tempo, da transição do velho ou “velha louca” para o novo ou “nova menina” chama-se Esperança. É essa a grande receita que temos que ter, a grande receita da vida que se renova a cada ano e a cada dia. Nossa esperança é o Deus na Cruz, que é a nossa esperança invisível de salvação não só vindoura, mas aqui e agora nos pequenos momentos da nossa vida como diz Paulo o Apóstolo: “ A esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado em nossos corações, pelo Espírito Santo que nos foi dado.” (Romanos 5.5). A esperança é a espera paciente pela fé de que Deus vai nos ensinar a contar os nossos dias (Salmo 90.12)! Que nesse ano possamos aproveitar ao máximo o Kairós, o momento no tempo, que Deus o Santo nos dá!

Nota: ¹ Vendigo é uma espécie de mostro gigantesco e assombroso gerado pela imaginação que traz os mortos de volta a vida segundo lendas indígenas de tribos do Maine estado Norte Americano. Stephen King usa o personagem no Livro O Cemitério.

Guilherme Costa


Sonhos Criativos

Nebulosa de Oríon

“No princípio, criou Deus os céus e a terra.” Gênesis 1.1

Sonhos, nossas vidas são constituídas por eles. Eles trazem esperança em tempos difíceis, eles enchem o nosso coração de alegria e muitas vezes são a razão de seus batimentos. O dicionário o define como: Seqüência de pensamentos, de idéias vagas, mais ou menos agradáveis, mais ou menos incoerentes, às quais o espírito se entrega em estado de vigília, geralmente para fugir à realidade; devaneio, fantasia; Desejo veemente; aspiração. Mas eles são mais que isso, na verdade são a fagulha da criatividade divina nos homens. O sonhos são nossos mecanismos de criação. Antes de aviões quebrarem a barreira do som, os homens sonharam com maquinas voadoras, um mito grego relata a estória de Ícaro um jovem que voou com seu “pássaro” gigante com asas de cera criado por seu pai, perto demais do sol e morreu no mar Egeu. Leonardo da Vinci um dos principais pensadores dos tempos modernos. Pintor, escultor, arquiteto, botânico, geógrafo e matemático desenhou com surpreendentes detalhes técnicos sua máquina voadora que nunca saiu do papel. Em suma todos os homens são plenos de sonhos e antes de qualquer ato criador humano primeiro vem ao lume sonhos e mais sonhos.

A magnificente história do começo revela um Deus “Sonhador” que tem o poder de imaginar criativamente e do nada criar a luz e da luz criar o dia. Nas galáxias, existe muita poeira e gás formando diversas nebulosas, uma imensa nuvem de gás e poeira entre as estrelas que incitada pela radiação dessas estrelas vizinhas produz luz. As moléculas desses gases, quando voltam ao seu estado fundamental, emitem a luminosidade que faz com que possamos ver a nebulosa. É o espetáculo mais belo do espaço, não passa de poeira, gás e luz, mas é a contemplação mais bela que há! Muito antes de um astro produzir energia por reações de fusão nuclear, já estava presente no universo poeira, gás e luz!

Contemple a magnífica criatividade criadora do Sagrado, sinta a poesia, a belíssima poesia viva da criação. O vazio o espaço, o céu e a terra, depois mares e rios serpenteando por cânions gigantescos. Ervas e árvores, rosas e tulipas, toda a vida marítima, toda a vida terrena; criados, esculpidos através da Palavra Criativa de Deus. Isso não é belo? Incompreensível demais? Inefável demais? Grandioso demais? Dos “sonhos” criadores de Deus surge um poema, um canto nostálgico, um grito de alegria, um ballet cheio de encanto, um caudaloso rio de vida e vida abundante e um magistral “livro” cheio de segredos! Antes de existir um homem sequer para maravilhar-se diante da tela do artista, para aplaudir o espetáculo, para se emocionar com o canto da vida. Deus criou um Santuário sem mácula, um jardim, um lar antes do medo, sem tempo, sem morte, sem dor, dádivas construídas pelo Deus que tudo que fez “era muito bom” . Examine, toque o espinho da roseira, sinta o cheiro do perfume da manhã, maravilhe-se diante das estrelas e encontrará apenas uma palavra que descreva tamanha grandeza. Amor!

Mas a criatividade de Deus não para por ai, o Supremo Arquiteto se torna o Construtor, o Pintor Talentoso toma o oficio do Escultor. Deus coloca suas mãos santas na terra que criou e modela um boneco de barro, em um ato humilde e enigmático sopra nas narinas inanimadas do boneco de barro o sopro da vida! Não é um Deus indiferente, não é um Deus como um “motor imóvel” em uma visão aristotélica, desprovido de sentimentos. Mas é sim um Deus que não liga de colocar suas nobres mãos no barro e criar o homem livre para amar! O ato criativo de Deus está exatamente em sua soberana vontade, que não o prende dentro de moldes e perspectivas humanas, mas assegura a sua total liberdade até mesmo para arriscar. Liberdade para se sujar de lama como uma pura criança e criar, liberdade para amar e para chorar se for preciso. E contudo continua sendo o Inexorável, o Deus Criador, o Soberano, o Santo, o Deus da Cruz ou o Deus na Cruz!

Diante da beleza da criação, da perspectiva, de um novo ano de um novo recomeço, da grandeza e beleza do espaço. Ficamos com a fagulha da criatividade divina em nós, nossos sonhos são essa fagulha. Sonhamos e ousamos sonhar para poder também como Deus criar. Criar uma piedade mais viva, um jeito novo de fazer novas ou velhas coisas, criar um mundo mais justo nem que seja “nosso pequeno mundo”! E confessamos como os filhos de Israel em Neemias 9.6: “Tu só és Senhor, tu fizeste o céu, o céu dos céus, e todo o seu exército; a terra e tudo quanto nela há; os mares e tudo quanto neles há; e tu os guardas em vida a todos; e o exército dos céus te adora”. Amém!



Guilherme Costa


A Resposta é o Amor


“Quem achar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a sua vida, por amor de mim, achá-la-á.” Mateus 10.39

Ao me deparar diante dos Mistérios do Sagrado sempre algo novo me chama atenção, já li algumas vezes os Evangelhos, mas nunca tinha me deparado com a verdade de palavras tão desafiadoras “Quem achar a sua vida perdê-la-á” ? O que Cristo quer realmente dizer com isso? Ao ler o contexto do texto o que vemos é a grande comissão dos discípulos, a missão dos doze, o Enviado que envia. Jesus envia os doze discípulos primeiramente as ovelhas perdidas da casa de Israel (Mt 10.5,6). O Mestre dá instruções não somente da missão que eles deveriam realizar naquele momento, mas dá instruções de qual caminho tomar, de como lidar com as pessoas, Jesus diz: “Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e símplices como as pombas.” (vv16). Os fariseus e grande parte do povo Judeu eram hostis ao Cristo. Seus ensinamentos estavam indo contra a ortodoxia judaica que privilegiava algumas pessoas, estava balançando o mundo, restaurando a dignidade de pobres miseráveis, leprosos, paralíticos mendicantes, prostitutas arrependidas, e assim Jesus ia trazendo um mensagem do céu; que quando ninguém se importa Deus se importa, que quando não há saída Deus abre a porta, e quando não há dignidade alguma Deus a dá no gesto glorioso e gracioso do perdão que sempre precede o arrependimento. Nos arrependemos porque fomos perdoados. Na lógica da graça as coisas são ao contrário. Não escolhemos Deus, Ele nos escolhe em Cristo; “ Nós o amamos a ele, porque ele nos amou primeiro.” (1João 4.19).

O que vemos nas palavras desafiadoras de Cristo? Qual o sentido e o real significado de achar a sua vida? Simples é mais prudente, é mais sábio, não “sair de casa”! Ficar no anonimato não seguir Jesus era a opção daqueles que temiam os fariseus e o povo; daqueles que temiam a dura ortodoxia que fazia de Deus um ser empedernido!

O problema é que qualquer pessoa que fizesse isso que “escondesse” sua vida com medo das represálias estaria na verdade tocando ela no buraco, estaria desperdiçando sua vida em prol de uma teologia sem vida, sem o objeto de sua busca o próprio Deus! O sistema religioso judaico era frio! E os sinais? Haviam. Sinais em abundancia, os sinais dos sacrifícios, o sinais “eternos de eternas festas” (Isaias 1.12-14), mas eles haviam esquecido o propósito, o anúncio por traz de cada sinal do seu culto. Isaias fala deste glorioso anuncia ao dizer profeticamente: Vinde, então, e argui-me, diz o Senhor: ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a branca lã.” (Isaias 1.18). Deus convida o povo a questiona-la “Vinde e arguir-me”, Deus convida o povo a interroga-lo “Vinde e arguir-me” e Deus convida o povo a examinar “Vinde e arguir-me”! Que por um ato soberano de bondade Ele faria os pecados se tornarem brancos, puros como a neve, Ele daria vida abundante. O que vemos nessa promessa? Um Deus que se relaciona, que diz o que o homem deve escolher: Aprendei a fazer bem; praticai o que é recto; ajudai o oprimido; fazei justiça ao órfão; tratai da causa das viúvas.” (Isaias 1.17); e permite que homem faça uma pergunta, questione o que Deus tem em mente “Vinde e arguir-me”. E a resposta que Deus dá é a resposta mais bela que alguém pode ouvir. Pecados perdoados, mundo reconciliado, salvação através de um Deus que se torna homem e morre no calvário! O sublime sinal de Deus e resposta aos homens é a Cruz. O Deus que desce até a morte para salvar. Essa salvação requer perder a vida, se entregar com todas, as forças com todas as energias, se lançar no escuro tendo pela fé a convicção que os braços de Deus vai nós apanhar! Contudo o perder a vida por Cristo se consiste no encontrar da VIDA. Uma das primeiras coisas que ocorrem com quem “perde a vida” e sair do anonimato e não se conformar com “ordotoxias” que tentam prender Deus ou a sinais miraculosos ou a letra morta de convicções meramente humanas. Jesus ensina que Deus Pai é o Pai que faz novo todas as coisas, que transforma, que age criativamente, que toca, que ama, que cura e faz milagres, mas também se esconde e sente tal agonia e medo ao ponto de chorar. Um Deus que se faz homem e sabe o que os homens sentem. Um Deus que bebe vinho e abençoa com mais vinho um casamento, um Deus que não tem onde recostar a cabeça, mas tira o peso da ansiedade dos discípulos dizendo pra eles observarem os pássaros. Um Deus que perdoa pecados de um paralítico que ousa quebrar as regras “ortodoxas” da guarda do sábado, um Deus que na verdade coloco as coisas no lugar certo dizendo: E disse-lhes: O sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado. Assim, o Filho do homem até do sábado é Senhor.” (Marcos 2. 27,28). Um Deus que “quebra regras e extrapola” curando em Betesda enquanto a multidão se aperta no Templo. Quem perder sua vida na verdade encontra outra vida, a vida abundante dada por Cristo. Uma vida de aprendizagem, uma vida de superação, e uma vida de santificação através da obra do Espírito. Santificação como “aurora”, uma vida de serviço de amor ao próximo, uma vida cuidando e amando os órfãos as viúvas e a todos que não tem com quem contar! Perder a vida é encontrar uma nova vida, é saber que muitos vão tacha-lo de muitas coisas, de heterodoxo”, “liberal”, “desviado”, “incrédulo”, “herege”; é saber que você pode ser perseguido ao dizer que Deus morreu na Cruz pra salvar o mundo e não por muitos, mas por todos.

Você pode citar textos como: “ Porque Deus amou o mundo, de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” (João 3.16). Que citaram textos como: E ele, respondendo, disse-lhes: O que semeia a boa semente é o Filho do homem; O campo é o mundo; a boa semente são os filhos do reino e o joio são os filhos do maligno; o inimigo, que o semeou, é o diabo; a ceifa é o fim do mundo; e os ceifeiros são os anjos.” (Mateus 13. 37-39). E com textos assim vão refutar seus argumentos dizendo que o campo é o mundo e no mundo existem dois tipos de pessoas joio e trigo com dois finais diferentes. Você poderá argumentar que o campo é formado por terra e não por joio ou trigo. O joio ou o trigo é o resultado do plantio das sementes ou das “influências” destas. Você poderá citar a parábola dos solos (Semeador) e dizer: Eis que o semeador saiu a semear. e, quando semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na; e outra parte caiu em pedregais, onde não havia terra bastante, e logo nasceu, porque não tinha terra funda; mas, vindo o sol, queimou-se, e secou-se, porque não tinha raiz. E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram, e sufocaram-na. E outra caiu em boa terra, e deu fruto: um a cem, outro a sessenta, e outro a trinta. Quem tem ouvidos para ouvir, ouça.” (Mateus 13.3-9). E desenvolver um belíssimo argumento a respeito dos solos desse campo onde esse semeador estava semeando. Havia pedregais, que são corações impermeáveis a ação da palavra (Semente), havia terra nesse campo cheia de espinhos que cresceram e sufocaram a semente e havia boa terra que é coração aberto a ação da palavra onde produz fruto e esse fruto se reproduz. Em suma você ao “perder” e encontrar sua vida na abundante vida do Cristo, vai logo perceber que discutir sobre teologia é uma roda da água sem água, que gira em milhões de argumentos, mas não produz nada além de atrito seco! Você vai perceber que é um absurdo pensar que os discípulos faziam ginásticas como as de cima para tentar entender os ensinamentos de Cristo. Que é bem simples, é o amor: “ Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis.” João 13. 34. Deus não age dentro de lógicas humanas! Por que Deus é amor e amor é o sentimento mais ilógico que existe, basta olhar na fila do presídio as pobres mães que vão visitar seu filhos!

“Quem achar a sua vida perdê-la-á” , mas quem a perder por amor encontrará uma nova maneira de viver construindo o reino de Deus entre os homens. E tendo apenas uma resposta a dar a quem ousar interpelar. A resposta é o amor!


Guilherme Costa